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Anulação de contrato de empréstimo por incapazes

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Peculiaridades devem ser observadas pelos bancos para evitar contingências.

 

A alegação de que a capacidade do contratante é um dos requisitos de validade do negócio jurídico e, portanto, que o contrato celebrado por agente incapaz é nulo, se faz presente em toda ação judicial que se discute a possibilidade de anulação ou invalidação de contrato de empréstimo celebrado por pessoa incapaz.

Conforme interpretação do próprio STJ, a sentença de interdição possui natureza declaratória da incapacidade, pois reconhece a alienação mental, e natureza constitutiva do estado de sujeição do interditado à curatela. Além disso, a sentença não apenas nomeia o curador, como também serve de prova suficiente da incapacidade do interditado a partir de sua publicação e registro, com efeitos ex nunc. Em outras palavras, os efeitos não retroagem, motivo pelo qual os negócios jurídicos celebrados antes da sentença só poderão ser anulados caso se comprove que o estado de incapacidade já existia no momento da celebração do contrato.

Por óbvio, as contratações de empréstimos por pessoas incapazes não são habituais quando o interditado é acamado, por exemplo. Porém, existem casos em que até o perito, em seu laudo, aponta como fator agravante o fato de que o interditado, para terceiros, pode se passar por uma pessoa normal psicologicamente, apenas impaciente ou pouco cooperativa, e fisicamente, podendo se locomover sozinho, sem a necessidade de cadeira de rodas ou ajuda de outrem, o que possibilita transações com terceiros de boa-fé.

O curador nem sempre conseguirá evitar que o interditado, sozinho ou acompanhado de familiares ou pessoas próximas, celebre um contrato de empréstimo. Entretanto, o curador deve ser diligente e buscar a nulidade do negócio jurídico o mais rápido possível. Ora, basta um único desconto na folha de pagamento ou direto na conta corrente do curatelado para que a existência da contratação seja constatada, haja vista que o curador tem acesso aos holerites e extratos bancários de titularidade do incapaz, pois exerce a função de administrador, a quem incumbe praticar todos os atos da vida civil pelo interditado, inclusive os de receber e administrar os vencimentos e as contas bancárias.

Assim, não se mostra razoável que o curador demore anos para verificar a existência dos descontos e, através dos meios legais, exarar sua inconformidade. Algumas jurisprudências, inclusive, apontam que tal situação caracterizaria a anuência tácita do curador, que, se não consumiu pessoalmente os valores contraídos junto às instituições financeiras, no mínimo, mostrou-se conivente com a contratação, sobretudo pelo grande lapso temporal entre a celebração do negócio e a pretensão de anular o ato.

Outro ponto que deve ser considerado é que nem sempre a anulação do negócio jurídico é a medida mais benéfica ao incapaz, pois certamente o banco ou a instituição financeira invocará o art. 182 do Código Civil, a fim de que o mutuário devolva a quantia emprestada. Ou seja, uma vez anulado o negócio, as partes devem retornar ao status quo ante (estado em que se encontravam antes da celebração do contrato), o que ensejaria a necessidade de devolução, pelo interditado, do montante disponibilizado pelo banco (muitas vezes já utilizado pelo incapaz ou seu curador), em evidente prejuízo ao interditado.

Tendo em vista que o instituto das incapacidades foi instituído pela lei com o propósito de proteger as pessoas que delas padecem, o art. 181 do CC dispõe que o incapaz somente ficará obrigado a restituir o valor se ficar comprovado que a quantia foi efetivamente empregada em seu favor, ônus que compete à instituição financeira.

Diante dessa situação é que os promotores, antes da manifestação ministerial, e os juízes, antes da prolação da sentença, devem levar em consideração a destinação do valor emprestado (se houve utilização dos recursos pelo interditado) e a boa-fé da instituição financeira. Em relação a esse último aspecto, deve-se analisar o contexto no qual o empréstimo foi celebrado (se a incapacidade era evidente, se a instituição financeira tinha condições ou não de suspeitar da incapacidade, se o interditado já era cliente do banco, se compareceu pessoalmente para celebrar o contrato etc.).

Portanto, caso seja declarada a nulidade do contrato de empréstimo, sem a caracterização de má-fé por parte do banco, o que foi descontado do incapaz deve ser restituído de forma simples, compensado do valor depositado na conta do mesmo, a fim de evitar enriquecimento ilícito pelo incapaz. Se, por outro lado, for verificado que o valor do empréstimo não foi por ele usufruído, deve-se investigar quem se utilizou do negócio jurídico em nome do incapaz em proveito pessoal, caracterizando aproveitamento ilícito.

Andréa Keler

Küster Machado Advogados
Küster Machado Advogados Com mais de 30 anos de atuação nacional, o Küster Machado Advogados oferece soluções jurídicas abrangentes nas esferas contenciosas e consultivas em mais de 20 áreas do Direito a nível nacional. Possui unidades nas cidades de Curitiba, Blumenau, Londrina, Florianópolis e São Paulo e desks na Suécia, China e Estados Unidos.

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